ENTREVISTA À AUTORA R.C. VICENTE
Olá Raquel!
Boa tarde, Pedro.
Bom… uma jovem de 22 anos, no mundo literário, só pode fazer uma coisa… lutar incessante e ferozmente pelos seus sonhos e objectivos. Trabalhar sem parar.
Esta história surgiu há muitos anos, quando eu tinha apenas cinco aninhos. Os meus pais tinham o hábito de me adormecer entre eles, pela noite, e o meu pai começou a inventar histórias no momento, a improvisar. Narrava-me um conto diferente todas as noites, e eu fechava os olhos e via tudo na minha cabeça, como se fosse um filme. Era algo tão mágico e colorido que acabava por ter em mim o efeito oposto. Adormecia primeiro a minha mãe, depois o meu pai… e eu ficava a protestar, a exigir que ele terminasse de me contar a história. Para além disto, a minha mãe costumava-me ler inúmeros contos infantis, e incentivou-me à escrita muito cedo, aliás, foi ela quem me ensinou a escrever — entrei no primário, e já sabia praticamente tudo. Em brincadeiras, com cinco anos, criei dois personagens. O Cavaleiro Andante e a Milady. Naquele tempo, na minha cabeça, aquelas duas figuras faziam imenso sentido. Enquanto brincava, interpretava essas figuras. Umas vezes era o Cavaleiro Andante, pegava num balde de cal que os meus avós tinham no quintal, misturava-lhe [sem que ninguém visse] um bocado de água, mexia aquilo tudo, e, após calçar uns carismáticos botins vermelhos, punha-me a andar de um lado para o outro, fingindo que o dito Cavaleiro Andante tinha dupla identidade e, desmascarado, era um homem comum, um simples leiteiro. Outras era a Milady, pegava num pedaço de pano, fingia que este era um xaile e punha-me a desfilar pela terra, fingindo perder a dita peça de vestuário e depois ser abordada pela primeira vez pelo Cavaleiro Andante, que ma vinha devolver. Outras vezes era a estalajadeira da vila em que eles viviam e dedicava-me a destruir tomates e outros legumes que a minha avó me dava para brincar, e sujava-lhe tudo. Depois também era o pai que se opunha ao amor do Cavaleiro Andante e da Milady, os inimigos do Cavaleiro Andante [ah… não imagina quantas vezes me atirei para a terra da fazenda, fingindo travar violentas batalhas…], e muitos outros, quase que incontáveis, personagens que ia criando todos os dias. Os anos foram-se passando e eu acho que me neguei a crescer. A vida corria-me mal e a minha forma de refúgio era parar no tempo, dormir de olhos abertos, e viver as aventuras daquelas figuras na minha mente. Dominei com maestria essa arte. Em casa, na rua, na escola, era um verdadeiro robot. Uma máquina. Estava ali o meu corpo, mas a minha mente e a minha alma estavam muito longe. Aos onze anos de idade, mudei-me para Espanha com os meus pais e o meu irmão mais novo, e com a minha história, obviamente. Descobri um novo mundo, conheci uma nova realidade e a minha mente expandiu-se. Surgiram centenas de novos personagens. Acho que o que aconteceu verdadeiramente foi algo muito simples: eu amadureci, e tudo o que criara até então foi igualmente forçado a crescer. Nós mudamos. As histórias também mudam. Isso aconteceu comigo. E foi nessa época em que me entreguei à literatura. Passei por uma fase anti-leitura, como todas as crianças, e quando me tornei numa pré-adolescente a única forma que a minha mãe encontrou de me aliciar, de me puxar novamente para os livros, foi recorrendo ao factor hormonal. Ao pecado dos pecados. Naquela época, eu queria apenas criar uma banda desenhada. Via na literatura algo demasiado sério, fora isso o que a escola me ensinara até ali. Literatura era coisa de gente bem comportada, educada. Literatura tinha regras, não dizia asneiras e era pura, casta. Imagine só o susto que apanhei quando a minha mãe me apresentou ao pecado literário, aos afamados romances de cordel. Júlias, Sabrinas, Biancas. Romances melosos com cenas de sexo. Numa época em que dizia que não gostava de ler, agarrei-me a esses livros apenas para provar da sua liberdade, matar a curiosidade e ser testemunha do pecado. Tal coisa alterou drasticamente a minha história, bem como a minha visão do mundo. Mas o auge da mudança deu-se quando eu tinha treze anos, aquando de uma das minhas visitas a Portugal. Estava em Santarém, num hipermercado, na zona da literatura, e a minha mãe exigiu-me que escolhesse um livro. Eu, que só me interessava por romances de cordel e banda desenhada japonesa, torci o nariz. Não queria aqueles assustadores montes de folhas. Mas tive de escolher um. Procurei pelas prateleiras e vi uma capa com um homem ruivo e uma espada. E impulsionada por uma exacerbada estupidez, pensei de imediato que aquele livro era um livro de banda desenhada japonesa. Escolhi aquele e ao chegar a casa desiludi-me. SÓ TINHA LETRAS. No entanto, lá me conformei e dei-lhe uma hipótese. Bastou-me uma linha, uma só linha para me apaixonar para sempre. Aquela obra era A Espada de Fogo, do autor Stuart Hill, um livro de fantasia. Com ele descobri que a literatura não tinha limites, que seres fantásticos existiam nela, era mais, que esses seres fantásticos compunham um só género. Descobri nesse momento a literatura, mas, acima de tudo, descobri-me a mim mesma. E soube, tive a certeza, que todas as histórias que criara até àquele momento, aquelas histórias que me acompanhavam nos bons e maus momentos, um dia seriam um livro. Dos meus treze anos para a frente, escrevi incessantemente o meu livro. Trabalhei-o. Dediquei-me de corpo e alma. Ajudou-me a superar o bullying, a violência e tortura psicológica à qual fui submetida por um suposto amiguinho do secundário, e uma depressão fruto disso. Aos dezoito anos escrevi ‘FIM’. Aos vinte e um, terminei uma edição de três anos, e o livro saiu. Assim surgiu a ideia, desenvolveu-se e nasceu o livro ‘O Ressurgir dos Eternos Titãs’. E caso se sinta curioso para saber o que aconteceu ao Cavaleiro Andante e à Milady da Raquel de cinco anos, eles são o Christyen Mönttbráncc e a Kandall Kandell em O Ressurgir dos Eternos Titãs.
Apoiaram-me desde o primeiro momento. Mas o verdadeiro voto de confiança veio quando eu dei provas do meu trabalho colocando um fim à primeira versão do manuscrito. Porque os sonhos são muito bonitos, mas sem trabalho, sem esforço, não significam nada. Se queremos a confiança dos outros, temos de dar provas do que valemos. Foi isso que aconteceu. Acreditaram desde o início, mais ainda quando provei que tinha vontade.
A minha mãe.
Nem pensar. Publicar o primeiro manuscrito de qualquer coisa é um erro feio, a não ser que se tenha uma equipa de peritos a transformarem algo carregado de erros e falhas numa obra-prima, ou seja, a fazerem o trabalho que nos compete. Aí é outra história. Agora quando tudo depende de trabalho árduo e honesto, do nosso trabalho, nunca se apresenta uma primeira versão. Eu perdi a conta às centenas de versões que escrevi de O Ressurgir dos Eternos Titãs. Por isso, não. A versão publicada não é a primeira. E sim, sofreu muitas alterações.
Ambos os meus pais me apoiaram.
Não decidi nada, acredite ou não. Aconteceu porque aconteceu. Porque senti que era assim. Eu não comando o meu mundo. Ele tem vida própria e desenvolve-se sozinho. Sou uma mera expectadora. Quanto à ‘‘era tipo medieval’’, bom, isso teve dedo meu. Em primeiro lugar permita-me que esclareça algo: Ídnulmör é gigantesco, não se limita àqueles continentes e ilhas apresentados no primeiro volume das crónicas. Mas mesmo que se limitasse a eles, permita-me esclarecer que as suas sociedades não são de ‘‘tipo medieval’’, pelo menos, não todas. O Império de Dovrökk é o único inspirado na Idade Média, uma Idade Média personalizada à minha maneira e adulterada pelas vontades do meu mundo e dos seus habitantes. O Império de Cálármand, por sua vez, é mais inspirado na Idade Moderna, com algumas características medievais. O Império de Órdepúr é fortemente inspirado na França do Rei Sol, bem como no Egipto Antigo. O Império de Anzúrme inspirado na Era Vitoriana. Por último, o Arquipélago Sálvicio na Idade Média e na Grécia Antiga, o Arquipélago Kórzino na Antiguidade e na Idade Moderna, e Karkalis e Jäje-Ýan são algo aparte, onde não obtive inspirações de épocas específicas, ou países\povos durante essas eras. Resumindo, o meu mundo é muito mais do que o apresentado, e, mesmo o apresentado, não se limita a uma única sociedade de ‘‘tipo medieval’’.
Se me apresentam um mundo fictício, quero nomes fictícios. Seria demasiado aborrecido, senão ridículo, criar um universo fantástico e em vez de chamar a Dovrökk… Dovrökk… dar-lhe o nome de Portugal ou Dinamarca. Também não seria muito lógico chamar a Maximiliano Von Rimer, Maximiliano Silva, ou Sousa. Se reparar, misturei nomes do nosso mundo com nomes criados por mim. E isto tem uma razão, o Iahannack, língua falada nos Gémeos Indomáveis, tem inspirações de diversas idiomas do nosso mundo. Eu queria algo só meu, mas também algo familiar. Desfragmentei algumas coisas, criei outras com base em sons que me transmitiam determinada sensação, e assim nasceram os nomes ‘‘pouco usuais’’ que misturei com nomes comuns cujos sons se podem encaixar no idioma ficcional que idealizei. Se estivesse a escrever Baixa Fantasia, subgénero onde estão inseridas histórias que contêm elementos fantásticos, mas que acontecem no nosso mundo, seria perfeitamente aceitável para mim usar nomes nossos. Mas na Alta Fantasia, onde tudo é criado de zero, não fazia sentido.
De certa forma chocada. Primeiramente porque ‘‘idêntico’’ é uma palavra muito forte. Depois, porque não possuo ainda nem uma décima parte da qualidade do mestre Martin. E sou forçada a dizer que quem faz esse tipo de declaração, ou não leu o meu livro, ou não assistiu à série, muito menos leu os livros de A Guerra dos Tronos. Famílias nobres a guerrearem entre si [e menciono isto pois já tivemos esta conversa em privado] existiam muito antes de A Guerra dos Tronos. Inglaterra, Portugal, toda a Europa, foi algo que fez parte do nosso passado. Da História do nosso mundo. E na minha história nem sequer é o foco principal, e é das poucas parecenças que podem ser apontadas entre o meu livro e a obra do mestre George R.R. Martin e respectiva adaptação. Mas são comentários que vão ser sempre feitos por quem não está acostumado ao género da Alta Fantasia, e, verdade seja dita, soa-me a elogio, não a ofensa. Rastejo aos pés do mestre Martin, sou uma formiguinha perto dele, é uma honra ver o meu trabalho ser comparado a tão grande senhor do género. Para estar no seu patamar — se é que alguma vez lá chegarei — ainda tenho muito caminho por percorrer. É uma honra ter conhecimento desse tipo de comparações.
Exactamente. Foi tudo feito por mim. Sou completamente obcecada com esta minha obra, queria tudo feito como havia idealizado. A verdade é que podia ter pedido à minha editora, dado as indicações todas, no entanto, preferi assim. Gosto de trabalhar com tudo o que está relacionado com arte. Foi um prazer e creio que me aproximou mais do leitor.
PERIGOSO. Foi fácil permitir que ele nascesse, difícil foi escrever a história sem cair em erros graves, em contradições.
A mesma dificuldade que mencionei na pergunta anterior sobre o mundo. Referir-me aos Deuses e a todas as histórias e lendas do mundo, e contrariar o dito na introdução e no prólogo durante o desenrolar da história.
Ainda é muito cedo para pensar nessas coisas e, para dizer a verdade, não estou muito familiarizada com o mundo do cinema.
Se o milagre de uma adaptação acontecesse, não seria nenhum conhecido. Defendo que se deve de dar oportunidades a novos talentos.
No meu livro? Theodósia Stelisbuz e Maximiliano Von Rimer. Pela forma e inteligência de que são senhores, e por toda a integridade que possuem atrás das suas máscaras de malvadez. No livro de outros autores? Oskan, de As Crónicas de Icemark, do autor Stuart Hill. É uma figura calma, inteligente e corajosa como poucas. Adoro-o. E a personagem feminina seria Corinn Akkaran da saga Acacia, do autor David Anthony Durham. É uma mulher de garra que [SPOILERS] após se apaixonar pelo usurpador do trono do seu pai e se descobrir grávida dele, teve a força necessária para fazer justiça.
Stuart Hill, Laura Gallego Garcia, J.R.R. Tolkien e David Anthony Durham. Não podem ser três, lamento imenso, Pedro. Têm de ser quatro. Hill, Garcia e Tolkien tiveram sem dúvida uma grande influência, são as minhas grandes inspirações, os meus deuses literários. Durham não teve influência alguma porque já tinha terminado O Ressurgir dos Eternos Titãs quando o descobri, mas adoro-o e defendo-o com todas as minhas forças.
Com umas rugas a mais? Estou a brincar! Ah… Daqui a 10 anos… espero ter encontrado o amor verdadeiro… Não um príncipe. Exijo o meu demónio. E espero ter filhos. Mas acima de tudo, espero ter conseguido fazer as minhas histórias chegarem a muitos leitores e poder desfrutar da alegria desse sucesso com a minha família amada.
Muito. Muito mesmo. Mas no bom sentido. Fui criada numa família de grandes valores, uma família honesta. Sou dona de uma grande ambição que só pode ser saciada justamente, com o esforço do meu trabalho e sem derrubar ou usar ninguém pelo meu caminho. Sou positivamente ambiciosa.
Não sinto nada. Algumas pessoas vão gostar, algumas pessoas vão odiar. Eu amo o meu livro, estou orgulhosa dele e fico feliz sempre que encontro alguém que também o ama. Quando não gostam dele, paciência. A vida é assim. Claro que, se a pessoa tiver uma crítica construtiva, que seja algo mais do que uma destrutiva mascarada e bem maquilhada, terei todo o prazer em ouvir ou ler, e tirar ideias que me ajudem a melhorar em obras futuras. É este o desafio de todo o escritor, aprender a filtrar.
À minha família, em especial, aos meus pais.
Já, mas não digo nada! Será o segredo mais bem guardado até 2018… ou 2019… ou 2020…
O JEDLP foi um projecto que criei em 2016 com o objectivo de promover a literatura lusófona, ou melhor, os novos autores da literatura lusófona. De momento, está parado. Contei na altura com a ajuda de outros escritores, no entanto, entre escrever livros, editar livros e alguns a lidarem com os seus trabalhos e estudos, foi impossível manter activo. Mas terei novidades para 2018. É um projecto que jamais morrerá. Os autores de língua portuguesa têm de se ajudar uns aos outros e o JEDLP foi criado para isso mesmo.
A Raquel…? Ah… Há tanta coisa para se dizer dela. É uma sonhadora e uma idealista acima de tudo, uma pessoa que acredita fortemente que pode mudar o mundo. É alguém que aprende muito com as palavras, o ser humano mais teimoso deste universo, alguém que explode facilmente e que se arrepende mais do que deveria. Teve as suas dificuldades ao longo da vida, mas superou-as todas sozinha. Caiu muitas vezes e levantou-se sempre. É baixinha e pode parecer a pessoa mais ingénua e ignorante do mundo — às vezes, é —, mas é um osso duro de roer. Sempre teve uma visão muito pessimista no que se refere a homens e, ainda assim, é a pior e mais incorrigível das românticas. É extremamente conservadora consigo própria e extremamente liberal com os outros, não se preocupando minimamente com a impressão que tal contraste possa causar no alheio. Tem as suas paixões, os seus ódios, vive mais para os outros do que para si mesma, e acredita facilmente. Demasiado facilmente. Gosta de se rir, de brincar, de fazer as mais lamentáveis figuras por pura diversão, mas também gosta de se sentar e aprofundar conversas, de conhecer almas e mentes. Pessoas ocas e materialistas são aquilo que ela mais detesta num ser humano. Para ela, é impensável uma pessoa dar uma fortuna por uns sapatos ou um carro e não dar um bocado de pão ao vizinho que passa fome. É rara a pessoa que a consegue enganar, e quem o faz é rapidamente descoberta. Sensitiva, cristã [não católica, não anglicana, apenas cristã], infantil, demasiado bruta, passional, leal e excessivamente honesta. Quando escreve, dá tudo o que tem. Odeia incompetência, odeia ser incompetente. Se é para trabalhar, ela fá-lo até à exaustão. E é comum ceder aos pedidos dos amigos, parando tudo o que está a fazer para os ajudar. Para a Raquel, o amor não tem nada de físico. Tem de ser a mais linda e intensa fantasia. Se não for assim, não é amor. Para a Raquel, uma pessoa que dá mais valor à aparência e conta bancária dos outros, não é gente, nem é bicho. Não queiram saber o que para ela são seres humanos desse calibre. É uma chorona diplomada. Sente tudo a dobrar, tão intensa que às vezes roça a loucura. Prefere o isolamento, a solidão campestre, do que a socialização. É sozinha que se sente melhor. E, infelizmente, o rosto dela é um livro aberto. Aquilo que sente, aquilo que pensa, para sua desgraça, é traduzido com demasiada evidência nas faces. As suas paixões são os animais, a arte, a escrita e a culinária. O seu doce pecado literário continuam a ser os romances de cordel. Prefere o campo à cidade. A montanha ao mar. A neve ao sol. O café ao chá. Gosta do seu chocolate bem negro e amargo, e da sua comida bem estranhamente portuguesa, o mais tradicional possível. A Raquel é… um alien vindo de um tempo muito antigo e de um planeta muito distante. À noite tira a pele e de dentro dela sai um dragão. Mas sheee… os americanos estão a vigiar-nos.
- Primeiramente... O que faz uma jovem de 22 anos no mundo literário?
Boa tarde, Pedro.
Bom… uma jovem de 22 anos, no mundo literário, só pode fazer uma coisa… lutar incessante e ferozmente pelos seus sonhos e objectivos. Trabalhar sem parar.
- Como surgiu a ideia para o livro?
Esta história surgiu há muitos anos, quando eu tinha apenas cinco aninhos. Os meus pais tinham o hábito de me adormecer entre eles, pela noite, e o meu pai começou a inventar histórias no momento, a improvisar. Narrava-me um conto diferente todas as noites, e eu fechava os olhos e via tudo na minha cabeça, como se fosse um filme. Era algo tão mágico e colorido que acabava por ter em mim o efeito oposto. Adormecia primeiro a minha mãe, depois o meu pai… e eu ficava a protestar, a exigir que ele terminasse de me contar a história. Para além disto, a minha mãe costumava-me ler inúmeros contos infantis, e incentivou-me à escrita muito cedo, aliás, foi ela quem me ensinou a escrever — entrei no primário, e já sabia praticamente tudo. Em brincadeiras, com cinco anos, criei dois personagens. O Cavaleiro Andante e a Milady. Naquele tempo, na minha cabeça, aquelas duas figuras faziam imenso sentido. Enquanto brincava, interpretava essas figuras. Umas vezes era o Cavaleiro Andante, pegava num balde de cal que os meus avós tinham no quintal, misturava-lhe [sem que ninguém visse] um bocado de água, mexia aquilo tudo, e, após calçar uns carismáticos botins vermelhos, punha-me a andar de um lado para o outro, fingindo que o dito Cavaleiro Andante tinha dupla identidade e, desmascarado, era um homem comum, um simples leiteiro. Outras era a Milady, pegava num pedaço de pano, fingia que este era um xaile e punha-me a desfilar pela terra, fingindo perder a dita peça de vestuário e depois ser abordada pela primeira vez pelo Cavaleiro Andante, que ma vinha devolver. Outras vezes era a estalajadeira da vila em que eles viviam e dedicava-me a destruir tomates e outros legumes que a minha avó me dava para brincar, e sujava-lhe tudo. Depois também era o pai que se opunha ao amor do Cavaleiro Andante e da Milady, os inimigos do Cavaleiro Andante [ah… não imagina quantas vezes me atirei para a terra da fazenda, fingindo travar violentas batalhas…], e muitos outros, quase que incontáveis, personagens que ia criando todos os dias. Os anos foram-se passando e eu acho que me neguei a crescer. A vida corria-me mal e a minha forma de refúgio era parar no tempo, dormir de olhos abertos, e viver as aventuras daquelas figuras na minha mente. Dominei com maestria essa arte. Em casa, na rua, na escola, era um verdadeiro robot. Uma máquina. Estava ali o meu corpo, mas a minha mente e a minha alma estavam muito longe. Aos onze anos de idade, mudei-me para Espanha com os meus pais e o meu irmão mais novo, e com a minha história, obviamente. Descobri um novo mundo, conheci uma nova realidade e a minha mente expandiu-se. Surgiram centenas de novos personagens. Acho que o que aconteceu verdadeiramente foi algo muito simples: eu amadureci, e tudo o que criara até então foi igualmente forçado a crescer. Nós mudamos. As histórias também mudam. Isso aconteceu comigo. E foi nessa época em que me entreguei à literatura. Passei por uma fase anti-leitura, como todas as crianças, e quando me tornei numa pré-adolescente a única forma que a minha mãe encontrou de me aliciar, de me puxar novamente para os livros, foi recorrendo ao factor hormonal. Ao pecado dos pecados. Naquela época, eu queria apenas criar uma banda desenhada. Via na literatura algo demasiado sério, fora isso o que a escola me ensinara até ali. Literatura era coisa de gente bem comportada, educada. Literatura tinha regras, não dizia asneiras e era pura, casta. Imagine só o susto que apanhei quando a minha mãe me apresentou ao pecado literário, aos afamados romances de cordel. Júlias, Sabrinas, Biancas. Romances melosos com cenas de sexo. Numa época em que dizia que não gostava de ler, agarrei-me a esses livros apenas para provar da sua liberdade, matar a curiosidade e ser testemunha do pecado. Tal coisa alterou drasticamente a minha história, bem como a minha visão do mundo. Mas o auge da mudança deu-se quando eu tinha treze anos, aquando de uma das minhas visitas a Portugal. Estava em Santarém, num hipermercado, na zona da literatura, e a minha mãe exigiu-me que escolhesse um livro. Eu, que só me interessava por romances de cordel e banda desenhada japonesa, torci o nariz. Não queria aqueles assustadores montes de folhas. Mas tive de escolher um. Procurei pelas prateleiras e vi uma capa com um homem ruivo e uma espada. E impulsionada por uma exacerbada estupidez, pensei de imediato que aquele livro era um livro de banda desenhada japonesa. Escolhi aquele e ao chegar a casa desiludi-me. SÓ TINHA LETRAS. No entanto, lá me conformei e dei-lhe uma hipótese. Bastou-me uma linha, uma só linha para me apaixonar para sempre. Aquela obra era A Espada de Fogo, do autor Stuart Hill, um livro de fantasia. Com ele descobri que a literatura não tinha limites, que seres fantásticos existiam nela, era mais, que esses seres fantásticos compunham um só género. Descobri nesse momento a literatura, mas, acima de tudo, descobri-me a mim mesma. E soube, tive a certeza, que todas as histórias que criara até àquele momento, aquelas histórias que me acompanhavam nos bons e maus momentos, um dia seriam um livro. Dos meus treze anos para a frente, escrevi incessantemente o meu livro. Trabalhei-o. Dediquei-me de corpo e alma. Ajudou-me a superar o bullying, a violência e tortura psicológica à qual fui submetida por um suposto amiguinho do secundário, e uma depressão fruto disso. Aos dezoito anos escrevi ‘FIM’. Aos vinte e um, terminei uma edição de três anos, e o livro saiu. Assim surgiu a ideia, desenvolveu-se e nasceu o livro ‘O Ressurgir dos Eternos Titãs’. E caso se sinta curioso para saber o que aconteceu ao Cavaleiro Andante e à Milady da Raquel de cinco anos, eles são o Christyen Mönttbráncc e a Kandall Kandell em O Ressurgir dos Eternos Titãs.
- O que disseram os seus pais quando lhes disse que queria publicar um livro?
Apoiaram-me desde o primeiro momento. Mas o verdadeiro voto de confiança veio quando eu dei provas do meu trabalho colocando um fim à primeira versão do manuscrito. Porque os sonhos são muito bonitos, mas sem trabalho, sem esforço, não significam nada. Se queremos a confiança dos outros, temos de dar provas do que valemos. Foi isso que aconteceu. Acreditaram desde o início, mais ainda quando provei que tinha vontade.
- Quem foi a primeira pessoa a ler o livro?
A minha mãe.
- A versão que foi publicada é a mesma desde sempre ou sofreu alterações?
Nem pensar. Publicar o primeiro manuscrito de qualquer coisa é um erro feio, a não ser que se tenha uma equipa de peritos a transformarem algo carregado de erros e falhas numa obra-prima, ou seja, a fazerem o trabalho que nos compete. Aí é outra história. Agora quando tudo depende de trabalho árduo e honesto, do nosso trabalho, nunca se apresenta uma primeira versão. Eu perdi a conta às centenas de versões que escrevi de O Ressurgir dos Eternos Titãs. Por isso, não. A versão publicada não é a primeira. E sim, sofreu muitas alterações.
- Quem foi a pessoa que mais a apoiou durante o processo de escrita?
Ambos os meus pais me apoiaram.
- Quem é o Maximiliano? É baseado em alguém do seu quotidiano?
O Maximiliano não é a minha primeira criação, mas é o meu filho. Não é baseado em ninguém. As vidas apresentadas em As Crónicas de Amindrius, Bérnia e Efendes nasceram do nada, sem bases ou influências. Existem e são livres, ainda que apenas na minha mente. O Maximiliano é a mais fascinante de todas elas. Chamo-lhe meu filho porque a sua forma de amar, de sentir, é muito semelhante à minha, embora sejamos completos opostos em muitos aspectos e as nossas histórias em nada estejam relacionadas… felizmente! Ele é o Demónio do Norte, o senhor de Dörv, o filho enjeitado de Vládimïr Von Rimer, uma das figuras mais temidas nos Gémeos Indomáveis. Para a verdadeira mãe dele, para mim… só posso dizer uma coisa que digo a muita gente em tom de brincadeira: ‘‘Não encontro homem perfeito porque chamo de filho ao meu homem perfeito’’. Maximiliano Von Rimer é o meu ‘‘ideal masculino’’, o meu adorado filho, o monstrinho amado da minha obra.
- Porque decidiu criar uma história baseada num mundo de Deuses e Magia? E porquê numa era tipo medieval?
Não decidi nada, acredite ou não. Aconteceu porque aconteceu. Porque senti que era assim. Eu não comando o meu mundo. Ele tem vida própria e desenvolve-se sozinho. Sou uma mera expectadora. Quanto à ‘‘era tipo medieval’’, bom, isso teve dedo meu. Em primeiro lugar permita-me que esclareça algo: Ídnulmör é gigantesco, não se limita àqueles continentes e ilhas apresentados no primeiro volume das crónicas. Mas mesmo que se limitasse a eles, permita-me esclarecer que as suas sociedades não são de ‘‘tipo medieval’’, pelo menos, não todas. O Império de Dovrökk é o único inspirado na Idade Média, uma Idade Média personalizada à minha maneira e adulterada pelas vontades do meu mundo e dos seus habitantes. O Império de Cálármand, por sua vez, é mais inspirado na Idade Moderna, com algumas características medievais. O Império de Órdepúr é fortemente inspirado na França do Rei Sol, bem como no Egipto Antigo. O Império de Anzúrme inspirado na Era Vitoriana. Por último, o Arquipélago Sálvicio na Idade Média e na Grécia Antiga, o Arquipélago Kórzino na Antiguidade e na Idade Moderna, e Karkalis e Jäje-Ýan são algo aparte, onde não obtive inspirações de épocas específicas, ou países\povos durante essas eras. Resumindo, o meu mundo é muito mais do que o apresentado, e, mesmo o apresentado, não se limita a uma única sociedade de ‘‘tipo medieval’’.
- Porque decidiu escolher nomes criados por si e pouco usuais?
Se me apresentam um mundo fictício, quero nomes fictícios. Seria demasiado aborrecido, senão ridículo, criar um universo fantástico e em vez de chamar a Dovrökk… Dovrökk… dar-lhe o nome de Portugal ou Dinamarca. Também não seria muito lógico chamar a Maximiliano Von Rimer, Maximiliano Silva, ou Sousa. Se reparar, misturei nomes do nosso mundo com nomes criados por mim. E isto tem uma razão, o Iahannack, língua falada nos Gémeos Indomáveis, tem inspirações de diversas idiomas do nosso mundo. Eu queria algo só meu, mas também algo familiar. Desfragmentei algumas coisas, criei outras com base em sons que me transmitiam determinada sensação, e assim nasceram os nomes ‘‘pouco usuais’’ que misturei com nomes comuns cujos sons se podem encaixar no idioma ficcional que idealizei. Se estivesse a escrever Baixa Fantasia, subgénero onde estão inseridas histórias que contêm elementos fantásticos, mas que acontecem no nosso mundo, seria perfeitamente aceitável para mim usar nomes nossos. Mas na Alta Fantasia, onde tudo é criado de zero, não fazia sentido.
- Como se sente quando dizem que o seu livro é idêntico à famosa série de televisão, “A Guerra dos Tronos”, adaptada dos livros de George R.R. Martin?
De certa forma chocada. Primeiramente porque ‘‘idêntico’’ é uma palavra muito forte. Depois, porque não possuo ainda nem uma décima parte da qualidade do mestre Martin. E sou forçada a dizer que quem faz esse tipo de declaração, ou não leu o meu livro, ou não assistiu à série, muito menos leu os livros de A Guerra dos Tronos. Famílias nobres a guerrearem entre si [e menciono isto pois já tivemos esta conversa em privado] existiam muito antes de A Guerra dos Tronos. Inglaterra, Portugal, toda a Europa, foi algo que fez parte do nosso passado. Da História do nosso mundo. E na minha história nem sequer é o foco principal, e é das poucas parecenças que podem ser apontadas entre o meu livro e a obra do mestre George R.R. Martin e respectiva adaptação. Mas são comentários que vão ser sempre feitos por quem não está acostumado ao género da Alta Fantasia, e, verdade seja dita, soa-me a elogio, não a ofensa. Rastejo aos pés do mestre Martin, sou uma formiguinha perto dele, é uma honra ver o meu trabalho ser comparado a tão grande senhor do género. Para estar no seu patamar — se é que alguma vez lá chegarei — ainda tenho muito caminho por percorrer. É uma honra ter conhecimento desse tipo de comparações.
- Soube que foi a Raquel que tratou de todo o design do livro, desde a capa, aos mapas até à paginação. Porquê?
Exactamente. Foi tudo feito por mim. Sou completamente obcecada com esta minha obra, queria tudo feito como havia idealizado. A verdade é que podia ter pedido à minha editora, dado as indicações todas, no entanto, preferi assim. Gosto de trabalhar com tudo o que está relacionado com arte. Foi um prazer e creio que me aproximou mais do leitor.
- Como foi criar um mundo totalmente novo e diferente do atual?
PERIGOSO. Foi fácil permitir que ele nascesse, difícil foi escrever a história sem cair em erros graves, em contradições.
- E quando à Mitologia? Quais foram as maiores dificuldades durante o processo de criação de uma mitologia totalmente nova?
A mesma dificuldade que mencionei na pergunta anterior sobre o mundo. Referir-me aos Deuses e a todas as histórias e lendas do mundo, e contrariar o dito na introdução e no prólogo durante o desenrolar da história.
- Se alguma produtora a contactasse para adaptar o seu livro a filme/série qual gostaria que fosse? Porquê?
Ainda é muito cedo para pensar nessas coisas e, para dizer a verdade, não estou muito familiarizada com o mundo do cinema.
- Quais os atores que escolheria para as personagens principais? Porquê?
Se o milagre de uma adaptação acontecesse, não seria nenhum conhecido. Defendo que se deve de dar oportunidades a novos talentos.
- Qual a sua personagem feminina preferida? E masculina? Porquê?
No meu livro? Theodósia Stelisbuz e Maximiliano Von Rimer. Pela forma e inteligência de que são senhores, e por toda a integridade que possuem atrás das suas máscaras de malvadez. No livro de outros autores? Oskan, de As Crónicas de Icemark, do autor Stuart Hill. É uma figura calma, inteligente e corajosa como poucas. Adoro-o. E a personagem feminina seria Corinn Akkaran da saga Acacia, do autor David Anthony Durham. É uma mulher de garra que [SPOILERS] após se apaixonar pelo usurpador do trono do seu pai e se descobrir grávida dele, teve a força necessária para fazer justiça.
- Quais são os seus três escritores preferidos? Sentiu alguma influência deles durante o processo de escrita?
Stuart Hill, Laura Gallego Garcia, J.R.R. Tolkien e David Anthony Durham. Não podem ser três, lamento imenso, Pedro. Têm de ser quatro. Hill, Garcia e Tolkien tiveram sem dúvida uma grande influência, são as minhas grandes inspirações, os meus deuses literários. Durham não teve influência alguma porque já tinha terminado O Ressurgir dos Eternos Titãs quando o descobri, mas adoro-o e defendo-o com todas as minhas forças.
- Como se vê daqui a 10 anos?
Com umas rugas a mais? Estou a brincar! Ah… Daqui a 10 anos… espero ter encontrado o amor verdadeiro… Não um príncipe. Exijo o meu demónio. E espero ter filhos. Mas acima de tudo, espero ter conseguido fazer as minhas histórias chegarem a muitos leitores e poder desfrutar da alegria desse sucesso com a minha família amada.
- Considera-se uma pessoa ambiciosa?
Muito. Muito mesmo. Mas no bom sentido. Fui criada numa família de grandes valores, uma família honesta. Sou dona de uma grande ambição que só pode ser saciada justamente, com o esforço do meu trabalho e sem derrubar ou usar ninguém pelo meu caminho. Sou positivamente ambiciosa.
- Como se sente quando recebe uma opinião menos agradável acerca do seu livro?
Não sinto nada. Algumas pessoas vão gostar, algumas pessoas vão odiar. Eu amo o meu livro, estou orgulhosa dele e fico feliz sempre que encontro alguém que também o ama. Quando não gostam dele, paciência. A vida é assim. Claro que, se a pessoa tiver uma crítica construtiva, que seja algo mais do que uma destrutiva mascarada e bem maquilhada, terei todo o prazer em ouvir ou ler, e tirar ideias que me ajudem a melhorar em obras futuras. É este o desafio de todo o escritor, aprender a filtrar.
- A quem dedica este seu “filho”?
À minha família, em especial, aos meus pais.
- Já iniciou o próximo livro? Alguma ideia do título? O que poderão os leitores esperar dele?
Já, mas não digo nada! Será o segredo mais bem guardado até 2018… ou 2019… ou 2020…
- Pode-me falar um pouco sobre o que é a JEDLP?
O JEDLP foi um projecto que criei em 2016 com o objectivo de promover a literatura lusófona, ou melhor, os novos autores da literatura lusófona. De momento, está parado. Contei na altura com a ajuda de outros escritores, no entanto, entre escrever livros, editar livros e alguns a lidarem com os seus trabalhos e estudos, foi impossível manter activo. Mas terei novidades para 2018. É um projecto que jamais morrerá. Os autores de língua portuguesa têm de se ajudar uns aos outros e o JEDLP foi criado para isso mesmo.
- Por fim, acha que me pode falar um pouco sobre a Raquel? Não a autora… a mulher.
A Raquel…? Ah… Há tanta coisa para se dizer dela. É uma sonhadora e uma idealista acima de tudo, uma pessoa que acredita fortemente que pode mudar o mundo. É alguém que aprende muito com as palavras, o ser humano mais teimoso deste universo, alguém que explode facilmente e que se arrepende mais do que deveria. Teve as suas dificuldades ao longo da vida, mas superou-as todas sozinha. Caiu muitas vezes e levantou-se sempre. É baixinha e pode parecer a pessoa mais ingénua e ignorante do mundo — às vezes, é —, mas é um osso duro de roer. Sempre teve uma visão muito pessimista no que se refere a homens e, ainda assim, é a pior e mais incorrigível das românticas. É extremamente conservadora consigo própria e extremamente liberal com os outros, não se preocupando minimamente com a impressão que tal contraste possa causar no alheio. Tem as suas paixões, os seus ódios, vive mais para os outros do que para si mesma, e acredita facilmente. Demasiado facilmente. Gosta de se rir, de brincar, de fazer as mais lamentáveis figuras por pura diversão, mas também gosta de se sentar e aprofundar conversas, de conhecer almas e mentes. Pessoas ocas e materialistas são aquilo que ela mais detesta num ser humano. Para ela, é impensável uma pessoa dar uma fortuna por uns sapatos ou um carro e não dar um bocado de pão ao vizinho que passa fome. É rara a pessoa que a consegue enganar, e quem o faz é rapidamente descoberta. Sensitiva, cristã [não católica, não anglicana, apenas cristã], infantil, demasiado bruta, passional, leal e excessivamente honesta. Quando escreve, dá tudo o que tem. Odeia incompetência, odeia ser incompetente. Se é para trabalhar, ela fá-lo até à exaustão. E é comum ceder aos pedidos dos amigos, parando tudo o que está a fazer para os ajudar. Para a Raquel, o amor não tem nada de físico. Tem de ser a mais linda e intensa fantasia. Se não for assim, não é amor. Para a Raquel, uma pessoa que dá mais valor à aparência e conta bancária dos outros, não é gente, nem é bicho. Não queiram saber o que para ela são seres humanos desse calibre. É uma chorona diplomada. Sente tudo a dobrar, tão intensa que às vezes roça a loucura. Prefere o isolamento, a solidão campestre, do que a socialização. É sozinha que se sente melhor. E, infelizmente, o rosto dela é um livro aberto. Aquilo que sente, aquilo que pensa, para sua desgraça, é traduzido com demasiada evidência nas faces. As suas paixões são os animais, a arte, a escrita e a culinária. O seu doce pecado literário continuam a ser os romances de cordel. Prefere o campo à cidade. A montanha ao mar. A neve ao sol. O café ao chá. Gosta do seu chocolate bem negro e amargo, e da sua comida bem estranhamente portuguesa, o mais tradicional possível. A Raquel é… um alien vindo de um tempo muito antigo e de um planeta muito distante. À noite tira a pele e de dentro dela sai um dragão. Mas sheee… os americanos estão a vigiar-nos.
Adorei a entrevista! É bom ver a Raquel, e, tenho de te agradecer por teres dado origem a esse mundo, e ao Maximiliano!
ResponderEliminarLembraste me agora do Acacia, e deu me saudade. Parei no 3 livro e estava a gostar muito.
Beijinhos e boas escritas! És uma inspiração.